PAV mostra-se exímio na narração de ambientes, com um admirável domínio vocabular setecentista, reflectindo uma notória capacidade investigativa, capaz de fazer inveja a não poucos historiadores, sustentando a narrativa num excelente conjunto de fontes coevas, que lhe alimentam a capacidade de efabulação a partir de problematizações histórico-sociais da época. Neste seu segundo romance, PAV apresenta o padre Malagrida como um misto de iluminado, de escolhido de Deus, militante eclesiástico, visionário, profeta do mal, socialmente excêntrico face aos próprios companheiros jesuítas, missionário obstinado, tão fanaticamente crente na missão divina da sua vida que não hesita em usar estratagemas ardilosos (como o das bolas de cera no mar) para exaltação de uma maior santidade pessoal e divina. Acresce um lado milagreiro, que espanta o próprio Diabo, e uam beatice supersticiosa, que atrai o mulherio crédulo de Lisboa e São Luís do Maranhão. Padre Malagrida é assim figurado, na visão ficcional de PAV, como o máximo exemplo da mentalidade evangélica dominante no Portugal de D. João V, em absoluto contraste com a nova mentalidade moderna e europeia elevada a figura de Estado de D. José I (excessivamente caricaturizado no romance, seguindo a tradição positivista oitocentista que identificava D. José com um rei tolo) e Marquês de Pombal, este denominado por Malagrida de Diábolos.
Diferentemente do romance de Luís Rosa, O Profeta do Castigo Divino constitui-se como o romance português que melhor descreve a tensão social entre estes dois «Portugais», finalizando com o auto-de-fé em que padre Malagrida é queimado, em 1761, anunciando a vitória (provisória) do Portugal iluminista.»
Miguel Real, JL nº 916 (9-22 de Novembro de 2005)
O escritor PAV escreve muito bem, de uma forma rebuscada, de acordo com a época, (aliás, aprendi algumas palavras que muito me divertiram (por exemplo as nefelibatices do padre Malagrida)) e documentou-se muito bem para retratar esta época. A utilização de um narrador surpresa e contar a história de uma forma não completamente linear foram outras das boas apostas para este livro. Soube-me muito bem o mergulho prolongado pelas diatribes dos nossos antepassados. E não é só o padre Malagrida o centro desta história. O senhor Sebastião José de Carvalho e Melo tem um protagonismo muito maior, como de resto teve na nossa História.
O único senão é que por vezes havia descrições um pouco exaustivas que se tornavam cansativas, ou sejam, criavam uma quebra na leitura.
Um comentário:
Não conhecia este livro, mas parece deveras interessante. Por acaso acabei de ler uma biografia dedicada a D. José, pelo que agora estou bastante curiosa acerca de tudo o que se passe nesse período.
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